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Espetáculo dividido em duas partes aborda diferenças geracionais


Reynaldo Gianecchini, Marco Antônio Pâmio e Bruno Fagundes (Foto: Hudson Rennan)

Em setembro, o espetáculo “A Herança”, adaptação brasileira da obra de Matthew Lópes que é sucesso na Broadway, estreia no Teatro Clara Nunes em um formato diferente do habitual no Brasil: em duas partes. A primeira estreia dia 14, enquanto a segunda entra em cena dia 29, trazendo o final da peça. No palco, é apresentado um confronto de gerações desde a década de 1980, quando aconteceu a explosão do HIV, até os dias atuais, promovendo uma discussão geracional sobre pertencimento, amadurecimento e amor no universo LGBTQIAPN+.


A peça apresenta o personagem Eric (Bruno Fagundes). Prestes a ser despejado de seu apartamento, enfrenta uma crise com o recém-noivo, o roteirista Toby, (Rafael Primot), às voltas com uma ascensão meteórica à fama. Tentando se compreender nesta fase turbulenta, Eric se aproxima de Walter (Marco Antônio Pâmio) e Henry (Reynaldo Gianecchini), homens mais velhos com outras visões e experiências. Em meio aos encontros e desencontros, surge em suas vidas Adam (André Torquato), e três gerações colidem e redefinem suas concepções sobre amor, afeto, perda, saudade e amizade.


“O formato é pouco explorado no Brasil. Se foi feito, foi no circuito alternativo. Até onde tenho conhecimento, no mainstream, é inédito”, palpita Fagundes, mencionando que antes da estreia em São Paulo, havia receio de como os espectadores reagiriam à proposta de um espetáculo dividido em dois. “O público recebeu tão bem, foi tão caloroso… As pessoas entenderam a proposta. Quando a segunda parte começa, a plateia já está íntima dos personagens. Deu muito certo! São quase 400 páginas de texto com muito humor. É muito leve, mas há momentos emocionantes”.


Para o elenco, essa divisão é um desafio: “A gente tem que começar a parte 2 com a mesma energia que terminou a anterior. Como a gente alterna os dias, fica um pouco mais confortável, já que a narrativa começa de onde a outra terminou. Ela ainda está na cabeça. É uma prontidão bastante desafiadora”, palpita Pâmio, que exalta também o ineditismo do trabalho: ‘Se eu for pensar em outro, citaria “Angel In América”, que foi muito emblemático na década de 1980, mas eram peças independentes. Se você assistisse a primeira, ela se completava nela mesma. A segunda era uma nova obra com os mesmos personagens. A nossa tem uma narrativa interrompida e que é retomada. É uma peça só”.


Já Gianecchini lembra que sua estreia no teatro também era um espetáculo longo (a encenação completa de “A Herança” dura aproximadamente sete horas, três e meia em casa sessão), mas de uma parte só. “A primeira peça que fiz tinha cinco horas de duração, então já comecei achando que isso poderia ser normal. Sou grande público de teatro, vou muito desde sempre. O que importa é uma história envolvente contada de uma forma interessante. O grande sonho do ator é isso: tocar as pessoas e se comunicar de alguma forma. Essa peça tem todos os elementos. A gente estava com essa curiosidade: como seria aqui no Brasil? De fato, está sendo incrível”.


Sobre a trama, o trio exalta qualidades diversas. “A maior parte da peça se passa em 2015, ano que foi muito recente. O que é legal é que é uma conversa geracional do que foi na época de 1980 e o que é agora. Fala do hoje. Não à toa se chama ‘A Herança’. Não é só do material, mas sim uma herança amarga, de dor dessa comunidade, mas também de delícias, individualidade, de respeito”, analisa Fagundes, que continua: “É uma troca sobre o que é um homem gay hoje. A peça usa a identidade sexual para falar sobre humanidade, perdas, amor, saudade, amizades. É uma conversa onde a pessoa exalta honrar o que ficou, quem lutou por liberdade lá atrás. Quando a gente não olha para trás, repete erros do passado e não se atenta a coisas que funcionaram antes”.


Para Pâmio, a montagem é uma crônica. “É uma observação sobre o quanto essas questões enfrentadas por uma comunidade se transformaram ao longo do tempo e dos processos geracionais. A gente vê um personagem, como o meu, que acompanhou o surgimento do HIV, o desconhecimento de como se transmitia, a pandemia que dizimou milhares de pessoas e a conduta muito irresponsável dos governos, que trazia muita desinformação. Não é algo que outros mais jovens, recém-saídos da adolescência, se importam tanto”. Interpretando dois papéis na montagem (ao todo, 12 atores revezam-se dando vida a 25 personagens), ele aponta que até os dois que interpreta vivem esse conflito: “Um é um escritor do século passado, que fica fascinado com a liberdade de expressão. Ele vem de um tempo que ser homossexual era sinônimo de ser preso até em prisão perpétua. Se admira com união estável, casamento ser legalizado. Na época dele, falar era crime”.


Gianecchini, por sua vez, vai além: “O texto é universal, altamente tocante e necessário. Fala de todas as questões do ser humano, mas é localizada na comunidade LGBTQIAPN+, o que a torna, ao meu ver, mais interessante. Nunca tivemos histórias contadas sobre esse universo sem ser no circuito alternativo ou que não fossem marginalizadas. Até hoje falamos do beijo gay na televisão. Nossa peça já parte do princípio que está tudo certo. Estamos falando de pessoas. Por acaso, são homossexuais vivendo histórias normais, de qualquer um”, analisa, comparando com as produções passadas que abordavam a população negra. “As histórias deles sempre falavam de escravidão ou preconceito. Não: a partir de hoje, são mocinhos. É questão de normalizar, de fazer o público entender a questão sem causar”.


O trio entrevistado pelo Jornal Posto Seis acredita que a temporada carioca irá repetir o sucesso da paulistana. “É quase como maratonar uma série. Você parcela. Cada parte possui dois intervalos, o que é interessante para ir ao banheiro, comprar pipoca… Todo mundo que vai assistir jura que não ficou três horas dentro do teatro. É uma unanimidade. Nossa peça é uma prova concreta de que tempo é relativo. Pessoas saem da parte 1 já comprando a 2 para voltar”, diz Bruno, que anuncia uma novidade para o Rio: “quem comprar a parte 1 agora paga a 2 com 50% de desconto”.


Serviço: “A Herança” | Teatro Clara Nunes (Rua Marquês de São Vicente, 52 3º piso – Shopping da Gávea) | Estreia da parte 1: 14 de setembro (quinta-feira), às 20h | Estreia da parte 2: 29 de setembro (sexta-feira), às 20h | Horários da parte 1 até 28 de setembro: de quinta a sábado, às 20h; e domingos, às 19h | A partir de 29 de setembro: parte 1 às quintas e sábados, às 20h; e parte 2 às sextas, às 20h; e aos domingos, às 19h | Ingressos para cada parte: de R$50 (meia) a R$130 (inteira) | Vendas na bilheteria do teatro ou em www.sympla.com.br | Classificação indicativa: 18 anos | Temporada: até 22 de outubro | Instagram: @aherancabr

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