Aos 85 anos, a atriz Leda Lúcia estrela o espetáculo “Devagarinho Eu Deixo”, também produzido pela veterana comediante. Em cartaz no Teatro Candido Mendes até o fim de agosto, o espetáculo é apresentado sempre às quintas-feiras, às 20h, com ingressos a partir de R$40. A montagem celebra os 62 anos de carreira da artista, que se mantém na ativa ininterruptamente durante todo esse período e aproveitou o momento para relembrar sua trajetória.
“Esse texto tem 40 anos, mas foi atualizado para o momento atual”, menciona. Na versão anterior, vivia o papel da empregada, atualmente interpretado por Cida Moraes – integram ainda o elenco Lula Medeiros e Sérgio Borelli. Na atual, dá vida à madame Lúcia sobre a qual a peça gira. A personagem, uma mulher sofisticada, é casada com um homem controlador e infiel, até que um dia, uma reviravolta movimenta toda a vida matrimonial do casal. “Isso é mostrado de uma forma muito engraçada, ainda que aborde a solidão feminina no casamento. Ainda acontece demais. Muitas são casadas, mas viúvas de maridos vivos porque eles não falam, não participam de nada, saem e não dão satisfações… As esposas ficam na solidão e aí vêm as consequências, mas só vendo a peça para entender”.
Apesar de feliz com a estreia e bem de saúde (“não tomo nenhum remédio”), a atriz aponta que o espetáculo pode ser uma despedida sua dos teatros. “Quis fazer essa comédia para quando sair do palco, estar bem. Não quero entrar toda ruim, já cansadinha e com dificuldade de andar. Não quer dizer que amanhã ou depois, caso me convidem para um show pontual, eu não faça, mas sem a obrigação de trabalhar. Quero curtir um pouco mais a casa, os netos… Já sou bisavó!”. Apesar desse pensamento, já pede bis para a montagem recém-estreada (a primeira sessão foi dia 1º de agosto): “Estamos procurando outro teatro para prolongar a temporada”. O Candido Mendes, entretanto, é valorizado pela artista ao convidar o público: “Para quem vai de metrô, é uma beleza. Desce na Nossa Senhora da Paz, sai em frente a igreja, atravessa e está ali. Quando termina, dá tempo de pegar o metrô de novo”.
Questionada sobre algum trabalho que não realizou ainda, pensa, mas não consegue responder. Afirma ter feito de tudo como atriz. “Já fiz drama, leitura dramatizada, cinema, novela, mas meu caminho sempre foi para o lado da comédia. Faço muitos números de plateia”, analisa, associando isso aos seus primeiros trabalhos: “Comecei em teatro de revista. Depois fiz ‘Chica da Silva’, um show do Carlos Machado em 1962. Ele era o rei da noite. Na época, trabalhei com a Grande Otelo e a Beth Farias que nem era atriz ainda, era bailarina. Estreei bem, rodeada de pessoas maravilhosas”.
O talento para fazer a plateia rir rendeu-lhe os convites para trabalhar com Chico Anysio, período do qual lembra com saudosismo: “Fiz ‘Chico City’ durante cinco anos (Leda vivia a personagem Eglantine). Era a filha do Canavieira (Anysio), noiva do Beleza (Carlos Leite)”. Em seguida, integrou o elenco de “Os Trapalhões”, de onde saiu para participar de “Chico Total”. Sua nova personagem, Caramuru, foi criada especialmente para ela, que, ao voltar a trabalhar com Anysio, estava grávida, situação que era incompatível com a realidade interpretada, o que rendeu muitas piadas.
Aquele período da comédia brasileira é lembrado com saudosismo. “Quase todos os grandes humoristas já foram embora. Aquela turma começou em teatro de revista, que foi uma grande escola. Não estou dizendo que agora não tenha mais, há alguns, mas não na quantidade que tínhamos. Você vai assistir um stand up do ator porque ele está fazendo televisão, aí você olha assim e fala ‘cadê a graça?’. Alguns nomes têm, mas infelizmente, perdemos os grandes e não está tendo substituição. A gente tinha, por exemplo, Walter D’Ávila. Bastava dar duas palavras e todo mundo ria. Era a maneira como ele falava, como a turma toda da Escolinha (do Professor Raymundo). Se pegar para ver no Viva, vai ver a diferença”, analisa, mencionando também o quanto os textos mudaram. “Não temos mais escritores como Arnaud Rodrigues, que escrevia maravilhosamente bem, ou Gugu Olimecha… Não temos mais isso nem em novelas. Repetem duas ou três por dia porque está faltando material”, sugere.
Em meio às recordações sobre sua carreira, cita outro lado que também foi muito exitoso: as peças infantis. “Ganhei muito dinheiro com elas, o que hoje em dia, está mais difícil. Fazíamos nas escolas, que cobravam dos alunos para nos pagar. Hoje, há a festinha no fim do ano com os próprios alunos e acabou”, lamenta, apontando que essas apresentações eram a entrada de muitas crianças para o universo teatral. Cabia à própria fazer a produção, como segue até os dias atuais, inclusive em “Devagarinho Eu Deixo”: “Dá trabalho e não é fácil. Estou aqui o dia inteiro coordenando os ingressos do pessoal que botou nome na lista amiga e de quem pagou os ingressos por PIX. Enquanto isso, tenho que mandar fazer banner, filipeta… Tudo sou eu quem faço”, orgulha-se, continuando: “Um amigo meu, um ano mais velho que eu e com um pique impressionante, faz shows, canta e diz que se parar, enferruja. Se a gente fica parado em casa, só vendo TV e comendo biscoito, engorda e começa a vir todos os problemas por ficar parado, sem fazer exercício… Tem que caminhar, botar a cabeça para pensar e raciocinar”, reflete.
Serviço: “Devagarinho Eu+ Deixo” | Temporada: até 29 de agosto | Apresentações: quintas-feiras, às 20h | Local: Teatro Cândido Mendes (Rua Joana Angélica 63 – Ipanema) | Ingressos: R$ 80 (inteira) e R$ 40 (meia entrada) | Vendas: Sympla ou na bilheteria. | Lotação da sala: 102 lugares (não há lugar marcado) - Não é permitida a entrada, após o início do espetáculo.
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