Publicado na edição 346 (2ª quinzena de setembro de 2012)
Prestes a completar 100 anos, a copacabanense Cecília Lopes da Rocha Bastos é humilde ao definir sua vida como “um filme sem importância”, apesar de reconhecer que todas as recordações são muito fortes e felizes. A poeta realizou inúmeros feitos, como incontáveis poesias e uma publicação que ensinou milhões de crianças a entenderem a cobrança do imposto de renda. Tudo isso paralelamente à sua carreira de auditora fiscal, onde atuou durante 35 anos.
Aos dois anos, perdeu o pai e passou a morar junto com sua mãe e irmão na casa de sua avó e de dois tios. Casou-se aos 22 anos e ficou viúva após dez anos de casamento. Durante o período de luto, começou a construir sua própria independência inscrevendo-se em concursos públicos. Passou em vários e só parou quando julgou ter alcançado o que a melhor remunerava.
Para ela, a dedicação ao trabalho foi o que fez sua mente continuar ativa, assim como os hábitos alimentares saudáveis. Iniciou sua carreira de auditora fiscal na Receita Federal por necessidade (“na época, mulher não trabalhava fora”, lembra) e permaneceu no cargo por 35 anos. Para não cair na compulsória, aposentou-se faltando apenas um dia para completar 70 anos.
Nessa função, escreveu o conto infantil “Dona Formiga, Compadre Tatu e o Imposto de Renda”, onde explica às crianças a razão desse imposto. A obra, lançada em 1970, fez parte do programa Contribuintes do Futuro e foi distribuída aos alunos dos primeiros anos do ensino fundamental. O site da Receita Federal, que disponibiliza a história na íntegra, calcula que cerca de 5 milhões de estudantes tiveram contato com a cartilha.
Cecília sempre gostou de redigir e começou a prática durante sua infância. Seu primeiro livro foi um romance, condizente com os filmes americanos que assistia. As poesias vieram depois, mas nunca haviam sido publicadas até sua única filha, Lilia, reuní-las em um livro que mesclou seus textos com fotos que marcaram sua vida. A coletânea foi um dos presentes de seu aniversário de 99 anos, em novembro de 2011. Apesar do gosto por essa arte, não tem um poeta favorito. “Eu leio na hora e ou gosto ou não gosto”, explica.
Moradora de Copacabana há 50 anos, lembra que, quando mais jovem, gostava de sair cedo para dar um mergulho no mar, acompanhada de conhecidas ou de Lilia (que destaca a semelhança física de sua mãe com escritora homônima Cecília Meirelles). Até hoje, Cecília mantém o hábito de passear pelo calçadão de manhã. À tarde, “faz o que quer e quando quer”, de acordo com ela própria.
Além do talento para a escrita, também demonstra aptidão em outras habilidades. Fala fluentemente francês e inglês (esse último idioma foi aprendido em menos de um ano) e toca violino, como hobby. Nunca fez nenhum trabalho na área musical e frequentemente era acompanhada por sua mãe, ao piano.
Suas diversas viagens ao exterior foram transformados em vários diários, cada um retratando um passeio. Neles, escrevia comentários e guardava cartões postais mapas, panfletos e outras lembranças. A copacabanense teve a oportunidade de conhecer vários países, como Europa, Japão, França, Inglaterra e Canadá.
Hoje, Cecília mora em um confortável apartamento junto com sua filha e duas amigas. Apesar da idade, sua filha destaca que ela continua sendo uma pessoa muito solidária, que gosta de ajudar a todos. Questionada sobre as comemorações para seu centenário, diz ainda não ter pensado em nada.
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