Thayssa Rodrigues
O menor bairro da cidade, apontado como a região que possui as vistas mais cobiçadas do Rio, a Urca reúne tudo o que um bom roteiro turístico deve ter em um pequeno espaço, que pode ser conhecido inteiramente em um único, e prazeroso, dia de passeio. Entre as atrações do bairro estão: Praia Vermelha, Pão de Açúcar (e seu famoso bondinho), Pista Cláudio Coutinho, Fortaleza de São João e Iate Clube do Rio de Janeiro, com suas imponentes embarcações a completar a paisagem da região. Como se não bastasse tudo isso, os visitantes podem admirar a vista através da mureta mais famosa da cidade, localizada as margens da Baía de Guanabara, e responsável por emoldurar um cenário deslumbrante. Além disso, construções centenárias se somam entre as sossegadas ruas do bairro, que também contam com bares e restaurantes magníficos.
A história da Urca passou por diferentes fases de desenvolvimento e, ao contrário de outros bairros da cidade, o planejamento transformou o espaço de forma calculada. Em seus tempos primórdios, ainda no século XVIII, a região onde suas construções residenciais estão localizadas sequer existia, pois todo o espaço ocupado por elas era, na ocasião, banhado pelas águas da Baía de Guanabara, que batiam nas rochas que ainda haviam por lá. Até então, a região se separava em duas extremidades inabitadas, que continham de um lado a Praia da Saudade, o Morro da Urca e sua Praia homônima e, de outro, a Praia Vermelha, o Morro do Pão de Açúcar, a Praia de Fora, o Morro Cara de Cão e a única construção do local, a Fortaleza de São João. O forte, aliás, indica a ligação direta da Urca com a fundação do Rio de Janeiro, quando ainda era conhecido como cidade de São Sebastião. Foi nesse local que, em 1565, Estácio de Sá desembarcou, com 120 barcos e 30 índios para fundar a cidade e se apropriar novamente da Baía de Guanabara, que desde 1655 estava sob o domínio francês. Para firmar sua ocupação construiu a fortaleza, em pedra lavada e granito, onde só era possível chegar pelo mar.
Em 1852, ainda sob o domínio português, o Imperador Dom Pedro II inaugurou o Hospício Dom Pedro II, conhecido posteriormente como Hospício Nacional dos Alienados, como uma obra de caridade (o terreno foi permutado pela Universidade do Brasil em 1947 e, atualmente, abriga o Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ). Paralelamente a isso, a rua de frente ao hospício, próxima a Praia da Saudade, ganhou uma muralha de pedra e concreto, que se transformaria depois em um local de grande apreciação popular. Dois anos depois, em 1854, o Imperador criou o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, nomeado, após a proclamação da República de Instituto Benjamim Constant, em homenagem ao seu primeiro diretor. A escola para deficientes visuais permanece ativa até hoje, no mesmo local onde foi edificada, em uma construção imponente preservada, ao longo dos anos, em seu estilo clássico de arquitetura.
Foi apenas entre os anos de 1870 e 1880, que o espaço da Urca começou a ser pensado como um novo estilo de cidade, que poderia abrigar habitações elegantes. A ideia, inovadora, foi proposta pelo comerciante português Domingos Fernandes Pinto, mas foi apenas na década seguinte que a proposta se formalizou. Em março de 1895 ele firmou contrato com a Intendência Municipal para ligar a Praia da Saudade (onde atualmente está localizado o Iate Clube do Rio de Janeiro) à Escola de Aprendizes de Artilheiros, montada junto a Fortaleza de São João, na extremidade do Morro Cara de Cão. No entanto, o projeto sequer saiu do papel, pois foi embargado pelo Exército sob a justificativa de que colocaria em risco a seguridade do Forte e, assim, a urbanização dessa área foi adiada novamente.
Em 1908, a Urca sediou um importante acontecimento, de proporções internacionais: a Exposição de 1908, em comemoração ao centenário de abertura dos portos. Para a ocasião, foram construídos diversos pavilhões, dentro dos quais eram expostos produtos manufaturados vindos de várias regiões do país. Três dessas construções existem até hoje, são elas: a casa que funcionou como Palácio dos Estados e hoje abriga o Museu de Ciências da Terra; o Pavilhão de Minas Gerais, atualmente ocupado pela escola de mesmo nome e o Pavilhão das Máquinas, no qual funciona a Escola de Teatro da Uni -Rio. Há quem diga que a real intenção do evento era apresentar a nova capital da república às autoridades que visitaram a mostra e não apenas expor os produtos brasileiros. De qualquer forma, as duas propostas foram cumpridas. O evento foi um sucesso e, em decorrência da exposição, o bairro passou a ser cobiçado, devido a sua posição geográfica privilegiada e a bela paisagem que o cerca.
Alguns anos depois, em 1920, o empresário Guilherme Guinle, da conhecida Família Guinle, aliado à família Rocha Miranda, resolveu fundar o Fluminense Yatching Clube, devido à paixão pelo iatismo. Para que o clube fosse instalado, foi escolhida a Praia da Saudade, que tornaria possível a disposição de embarcações na Baía de Guanabara. Assim, depois de negociar e conseguir a liberação, a praia foi aterrada e o clube construído no local, que posteriormente seria denominado como Iate Clube do Brasil e mais recentemente, rebatizado como Iate Clube do Rio de Janeiro.
No mesmo ano, a Sociedade Anônima Empresa da Urca, fundada por um grupo de acionistas empreendedores, deu início as obras que transformariam a área no bairro residencial que se apresentaria mais tarde. Na época, o então Prefeito Carlos Sampaio, iniciou uma série de mudanças na cidade, tendo em vista a Exposição do Centenário da Independência que aconteceria dois anos depois. Entre os planos de modificações, se encaixou a ideia de formação do bairro da Urca, sob a condição preliminar de construir um Hotel Balneário, em frente à Praia da Urca, para acomodar os turistas que viriam assistir a exposição e uma piscina olímpica de água salgada para sediar competições esportivas. A partir de então, a área foi aterrada com areia da própria Baía de Guanabara, bombeada através de uma draga e, como prometido, a piscina foi feita, formando o conhecido "Quadrado da Urca" (uma área separada do mar da antiga Praia da Saudade por uma ponte de pedra suspensa, que permitia a entrada da água ao quadrado, que foi cercado por uma arquibancada, também de pedra. O lugar existe até hoje e abriga barcos de pescadores), assim como o hotel foi edificado nos moldes pedidos.
Após o evento, entretanto, a obra suntuosa do resort, projetada pelos arquitetos Archimedes Memória e Francisco Cuchet, perdeu a serventia e ficou inutilizada por alguns anos, até ser comprada pelo empresário Joaquim Rollas, em 1935, que transformou o lugar no famoso Cassino da Urca. A casa de jogos foi palco de apresentações musicais protagonizadas por figuras importantes da cultura brasileira, como a pequena notável Carmem Miranda. O período de glórias do cassino terminou quando os jogos de azar foram proibidos pelo governo, em 1946, e logo depois a casa fechou as portas. Em 1950, no entanto, o lugar foi adquirido pelo empresário das comunicações, Assis Chauteaubriand, que o transformou no estúdio da TV Tupi, primeira emissora de televisão da América Latina, que funcionou ativamente até a morte de seu empresário, em meados dos anos 1960. Após o ocorrido, o espaço, tombado como patrimônio histórico e cultural, passou a ser locado por escritórios. A essa altura, a região já estava tomada por habitações, cortadas por agradáveis ruas, formando caminhos arborizados entre as várias praias do bairro, que já era considerado, pelas revistas especializadas, como "um lugar de risonhos bangalôs à beira-mar".
Por ocupar dimensões muito menores que as normais, quando comparado aos demais bairros da cidade, a Urca possui uma união enorme entre seus habitantes que, a partir dos anos 1970, se organizaram em uma associação para defender a preservação do ambiente e evitar grandes construções na área, que em 1978 foi denominada pela Prefeitura como sendo de proteção ambiental e paisagística.
Atualmente, os visitantes que passeiam por lá contam com a possibilidade de caminhar por um ambiente agradável e bonito, que abriga bares, restaurantes, praias e o famoso bondinho, em perfeita harmonia com a natureza, abundante, que se descortina ao seu redor. Entre uma caminhada e outra, é possível se deparar com verdadeiros marcos da história da cidade, como o Monumento aos Heróis das Lagunas e Dourados, situado na Praça General Tibúrcio, em frente a estação do Pão de Açúcar. A estátua, produzida pelo Escultor brasileiro Antônio Pinto de Moraes, em homenagem aos combatentes do exército nacional, ilustra em tamanho real alguns dos heróis brasileiros e funciona como um mausoléu, já que a cerca de nove degraus abaixo do nível do solo estão sepultados os corpos de algumas dessas figuras emblemáticas na história do país. Por outras vielas, igualmente aprazíveis, é possível sentar a beira mar e desfrutar de boa comida, mediante uma vista encantadora.
Fontes: In: http://www.urca.net In: http://www.dphcex.ensino.eb.br/?page=de_saojoao In: http://www.riodejaneiroaqui.com/figuras1/mapa-ruas-e-turistico-da-urca-1600.jpg In: http://www.riodejaneiroaqui.com/portugues/urca-bairro.html In: http://www.rioecultura.com.br/coluna_patrimonio/coluna_patrimonio.asp?patrim_cod=39 In: http://rio-curioso.blogspot.com.br/2007/08/bairro-da-urca_15.html In: http://www.rioguiaoficial.com.br/noticias/mureta-mais-famosa-da-cidade In: http://www.icrj.com.br/livro_icrj/default.html
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